terça-feira, 13 de março de 2012

A curiosa economia brasileira

Vivemos uma situação curiosa na economia brasileira. Quase todos os economistas concordam sobre os avanços obtidos nos governos FHC e Lula.  Embora divirjam, é claro, sobre os méritos de cada um deles pelo conjunto da obra.   
A verdade é que, de fato, nas últimas duas décadas, o Brasil melhorou.  Estabilizou a moeda, criou um regime de metas para a inflação que confere maior previsibilidade para a política monetária, consolidou a idéia de um regime fiscal com superávits primários nas contas do Tesouro Nacional e reforçou o papel do estado na realização de políticas direcionadas para a redução das desigualdades sociais.
A estrutura básica destas políticas foi criada por FHC e mantida por Lula. A diferença positiva, na era Lula, ficou por conta da valorização das políticas de transferência de renda através do programa Bolsa Família; a negativa, o abandono da agenda de reformas estruturais.         
A economia brasileira cresceu desde FHC, ainda que menos do que os países emergentes. As receitas do governo federal aumentaram na esteira da produção, do consumo e da elevação da carga de impostos.  A desigualdade social, medida pelo índice de Gini, diminuiu. As reservas internacionais do país superaram a marca histórica de 200 bilhões de dólares.
Desde 2003, foram gerados 14 milhões de empregos. O Brasil atingiu a marca histórica de 43 milhões de trabalhadores com emprego formal e os salários aumentaram 18,25% em termos reais. O desemprego, que era de 12,3% em 2003, caiu para 6,2 % em 2010.
O Brasil viu sua classe média crescer expressivamente: em 2002, este segmento formado por famílias com rendimento de cinco a dez salários mínimos, totalizava 13 milhões brasileiros, 26% da população total do país; em 2010, ela abrangia  57 milhões de brasileiros, 33% de todos os brasileiros.
Isso significa que 44 milhões de pessoas mudaram de posição na estrutura social e de renda do país na ultima década, um feito sem paralelo na história brasileira. Estimativas indicam que, em 2020, 60% dos brasileiros farão parte desta classe social, aproximadamente 120 milhões de brasileiros.
Tudo isso é verdadeiro. Porém, cabe a pergunta: se o Brasil vem crescendo sem as reformas elas eram mesmo necessárias?
Até onde podemos crescer sem as reformas?
Três dessas reformas são apontadas como as mais importantes.
A tributária, para dar maior competitividade à economia brasileira num cenário de ampliação da concorrência internacional e reduzir o custo dos produtos e serviços no mercado interno.
A previdenciária, para diminuir as distorções no sistema de aposentadorias, principalmente no setor público, e com isso ajudar a recuperar a capacidade de investimento do Estado brasileiro. 
 E a trabalhista, para modernizar as leis que regulam o mercado de trabalho, muitas delas desnecessárias, velhas, burocráticas e que implicam em custos elevados para as empresas.  Ela é indispensável, também, para melhorar a economia brasileira como um todo.
O crescimento da economia brasileira no período recente foi provocado por três fatores básicos: a elevação do preço das commodities  no mercado internacional (agrícolas e minerais), a expansão do crédito interno e o aumento dos gastos governamentais.
Estes três fatores não têm, evidentemente, condições de sustentar o crescimento econômico no longo prazo.
Nada garante que os preços das commodities continuem subindo ou permaneçam no patamar atual, ao contrário, a previsão é de que eles recuem. Em 2011, quase 40 % do nosso saldo comercial foi obtido com a China. Exportamos R$ 40 bilhões para o país, R$ 18 bilhões em minério de ferro, R$ 10,5 bilhões em soja e R$ 4,3 bilhões em petróleo. 
O crescimento do crédito no Brasil deve ser mais lento daqui para frente, pois já está no patamar de 50% do PIB e os gastos governamentais já se encontram num nível muito elevado. E, o pior, o Estado brasileiro gasta muito em custeio e pouco em investimentos na formação da infraestrutura básica do desenvolvimento.  
Diferentemente do cenário atual, o ideal é ancorar o crescimento da economia no aumento da capacidade produtiva e inovação da indústria, na melhoria da produtividade e da agregação de valor na produção agrícola, na melhoria das condições gerais da infraestrutura do país e na elevação da capacidade do nosso parque científico e tecnológico. E, por conseguinte, na capacidade de inovação e geração de valor nos produtos exportados.
Porém, não é este o cenário que se prenuncia.
Além disso, além de abandonar a agenda das reformas, optando por mudanças cosméticas e de reduzido impacto, o Estado brasileiro continua enfrentando uma condição estrutural de pequena capacidade de investimentos em áreas fundamentais para o futuro próximo do Brasil: infraestrutura, educação e inovação.  
Este é o dado curioso: todos parecem satisfeitos com os resultados positivos de curto prazo, esquecendo-se de que, logo ali adiante, eles não serão suficientes para lançar o país num processo de crescimento sustentável.
Será que alguém pensa que podemos disputar as primeiras posições na economia mundial com um modelo “agromineral”, dependente do preço internacional de “commodities”?

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