Vivemos uma situação curiosa na economia brasileira. Quase todos os
economistas concordam sobre os avanços obtidos nos governos FHC e Lula.
Embora divirjam, é claro, sobre os méritos de cada um deles pelo
conjunto da obra.
A verdade é que, de fato, nas últimas duas décadas, o Brasil melhorou.
Estabilizou a moeda, criou um regime de metas para a inflação que
confere maior previsibilidade para a política monetária, consolidou a
idéia de um regime fiscal com superávits primários nas contas do Tesouro
Nacional e reforçou o papel do estado na realização de políticas
direcionadas para a redução das desigualdades sociais.
A estrutura básica destas políticas foi criada por FHC e mantida por
Lula. A diferença positiva, na era Lula, ficou por conta da valorização
das políticas de transferência de renda através do programa Bolsa
Família; a negativa, o abandono da agenda de reformas
estruturais.
A economia brasileira cresceu desde FHC, ainda que menos do que os
países emergentes. As receitas do governo federal aumentaram na esteira
da produção, do consumo e da elevação da carga de impostos. A
desigualdade social, medida pelo índice de Gini, diminuiu. As reservas
internacionais do país superaram a marca histórica de 200 bilhões de
dólares.
Desde 2003, foram gerados 14 milhões de empregos. O Brasil atingiu a
marca histórica de 43 milhões de trabalhadores com emprego formal e os
salários aumentaram 18,25% em termos reais. O desemprego, que era de
12,3% em 2003, caiu para 6,2 % em 2010.
O Brasil viu sua classe média crescer expressivamente: em 2002, este
segmento formado por famílias com rendimento de cinco a dez salários
mínimos, totalizava 13 milhões brasileiros, 26% da população total do
país; em 2010, ela abrangia 57 milhões de brasileiros, 33% de todos os
brasileiros.
Isso significa que 44 milhões de pessoas mudaram de posição na
estrutura social e de renda do país na ultima década, um feito sem
paralelo na história brasileira. Estimativas indicam que, em 2020, 60%
dos brasileiros farão parte desta classe social, aproximadamente 120
milhões de brasileiros.
Tudo isso é verdadeiro. Porém, cabe a pergunta: se o Brasil vem crescendo sem as reformas elas eram mesmo necessárias?
Até onde podemos crescer sem as reformas?
Três dessas reformas são apontadas como as mais importantes.
A tributária, para dar maior competitividade à economia brasileira num
cenário de ampliação da concorrência internacional e reduzir o custo dos
produtos e serviços no mercado interno.
A previdenciária, para diminuir as distorções no sistema de
aposentadorias, principalmente no setor público, e com isso ajudar a
recuperar a capacidade de investimento do Estado brasileiro.
E a trabalhista, para modernizar as leis que regulam o mercado de
trabalho, muitas delas desnecessárias, velhas, burocráticas e que
implicam em custos elevados para as empresas. Ela é indispensável,
também, para melhorar a economia brasileira como um todo.
O crescimento da economia brasileira no período recente foi provocado
por três fatores básicos: a elevação do preço das commodities no
mercado internacional (agrícolas e minerais), a expansão do crédito
interno e o aumento dos gastos governamentais.
Estes três fatores não têm, evidentemente, condições de sustentar o crescimento econômico no longo prazo.
Nada garante que os preços das commodities continuem subindo ou
permaneçam no patamar atual, ao contrário, a previsão é de que eles
recuem. Em 2011, quase 40 % do nosso saldo comercial foi obtido com a
China. Exportamos R$ 40 bilhões para o país, R$ 18 bilhões em minério de
ferro, R$ 10,5 bilhões em soja e R$ 4,3 bilhões em petróleo.
O crescimento do crédito no Brasil deve ser mais lento daqui para
frente, pois já está no patamar de 50% do PIB e os gastos governamentais
já se encontram num nível muito elevado. E, o pior, o Estado brasileiro
gasta muito em custeio e pouco em investimentos na formação da
infraestrutura básica do desenvolvimento.
Diferentemente do cenário atual, o ideal é ancorar o crescimento da
economia no aumento da capacidade produtiva e inovação da indústria, na
melhoria da produtividade e da agregação de valor na produção agrícola,
na melhoria das condições gerais da infraestrutura do país e na elevação
da capacidade do nosso parque científico e tecnológico. E, por
conseguinte, na capacidade de inovação e geração de valor nos produtos
exportados.
Porém, não é este o cenário que se prenuncia.
Além disso, além de abandonar a agenda das reformas, optando por
mudanças cosméticas e de reduzido impacto, o Estado brasileiro continua
enfrentando uma condição estrutural de pequena capacidade de
investimentos em áreas fundamentais para o futuro próximo do Brasil:
infraestrutura, educação e inovação.
Este é o dado curioso: todos parecem satisfeitos com os resultados
positivos de curto prazo, esquecendo-se de que, logo ali adiante, eles
não serão suficientes para lançar o país num processo de crescimento
sustentável.
Será que alguém pensa que podemos disputar as primeiras posições na
economia mundial com um modelo “agromineral”, dependente do preço
internacional de “commodities”?
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