sexta-feira, 31 de agosto de 2012

O eleitor e a política II

As ideologias, infelizmente, não podem ser abolidas. Elas podem ser escondidas ou dissimuladas. O fato é que, queira o eleitor ou não, todos os políticos tem uma ideologia, em resumo, uma visão de como a sociedade deve ser organizada, quais os valores morais que devem predominar nas relações entre as pessoas entre si e entre elas e o poder.
Uma das mais graves dificuldades com a política moderna, não apenas no Brasil mas também em outros países, reside no fato de que os partidos crescentemente estão perdendo suas identidades, rendendo-se às contingências ou necessidades de curtíssimo prazo.  O cálculo eleitoral está transformando-os, cada vez mais, em aparatos de dissimulação e tornando os políticos cada vez mais hábeis na “arte” de dizer o que quer o eleitor, auxiliados pelo “marketing político”,  tudo em nome do  pragmatismo, da necessidade de “vencer a qualquer custo”.
Assim, prisioneiros da retórica, os partidos tornam-se cada vez mais confusos e turvos, dificultando ao eleitor a tarefa de entender os valores que orientam as propostas e as atividades dos políticos, enfim, sua ideologia. Como saber se eles estão mentindo ou simplesmente escondendo a sua ideologia?
Não existe uma receita única para enfrentar a confusão. Eu sigo os seguintes passos:  
a)     procuro prestar atenção no programa do partido ao qual percente o candidato; é chato mas é instrutivo. Você vai descobrir que poucos são os candidatos que se mostram coerentes e muitos de partidos que se dizem de esquerda defendem bandeiras da direita, e vice-versa.
b)     sempre que possível,  investigo se em suas falas existe algum indício de que defende que os fins justificam os meios. Se você fizer isso vai descobrir, com facilidade, que muitos deles em nome da igualdade ou de outros valores supostamente generosos defendem políticas que promovem a desigualdade entre as pessoas. Não se faz o bem recorrendo, ainda que temporariamente, ao mal.
c)     Investigo se o candidato acredita em valores universais como o bem, a liberdade, o respeito ou pensa que todos os valores são “relativos”, que dependem da cultura de cada povo ou das “necessidades” do momento. Em geral, quem assim pensa, conscientemente ou não, defende ou justifica os costumes e as práticas mais hediondas, até mesmo mutilação de mulheres e homicídios.
Esses critérios, é claro, não compõem uma fórmula perfeita para definir o bom ou o mau político. No entanto, oferecem alguma base para separar aqueles que acreditam que a política pode ter algum conteúdo ético daqueles que a vêem apenas como uma “prática”, um instrumento ou uma “técnica” como outra qualquer para atingir um objetivo previamente determinado.  Um vale tudo.
Sei que é difícil pensar na importância dos valores éticos na política, afinal,  desde Maquiavel , passando por todo o racionalismo iluminista,  esta tem sido  vista e incentivada como algo que nada tem a ver, em qualquer sentido, com a moral. A política é, cada vez mais, um conjunto de práticas divorciadas da moral, um mero um jogo que nada tem a ver com a boa conduta e com a justiça.
Lembram, Maquiavel, numa contradição que justificaria até mesmo o seu próprio assassinato, defendia que o príncipe poderia usar de todos os expedientes para se manter no poder, entre os quais,evidentemente, matar os seus próprios conselheiros. Os iluministas, defendendo a secularização do Estado e apelando para a superioridade da razão na condução dos assuntos do poder, acabaram por retirar da política qualquer norte ou fundamento moral. 
Não bastasse isso, no período mais recente, a ascensão do “relativismo” que tudo justifica, em nome do respeito às diferenças, tornou o quadro ainda mais desesperador para aquele que acredita que a vida, inclusive a política, deve e pode ser regida pela ética. Nenhum valor, nenhum princípio, nenhuma norma, a não ser as inócuas promessas ligadas à “legalidade” vigente orientam a política.  Ao invés de valores universais, o relativismo introduziu a “legitimidade” das “várias éticas”. Tudo é válido,  desde que faça parte de uma “cultura” determinada.   
Neste mundo “perdido” de orientadores éticos, a “receitinha” acima pode ser bastante útil. 

FONTE: AdOnline

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