quarta-feira, 25 de abril de 2012

Apenas reflexões sobre a nossa indústria

Por David da Silva Sousa*
Outro dia, ouvi um criativo dizer que o atendimento está mais para uma secretária organizada. Isso quando ele é bom. E, justamente por serem organizados, os briefings também o são, tornando-se motivo de orgulho para a área, que cria a falsa sensação de poder disparar a sua competência contra o restante da agência, em especial, contra a criação. O dito é: faço minha parte! Esquecendo-se simplesmente de que, uma parte precisa das outras para ser o todo, o fim do funil.
Por outro lado, os criativos saem da faculdade entendendo que propaganda é fazer anúncios de páginas duplas com uma sacada bacana e empurrando para cima do atendimento a responsabilidade de vender. E, se não vender, (empurrar goela abaixo do cliente) é burro. O pior é que muitas vezes, a ideia é equivocada, portanto ineficiente, e só retroalimenta um alter ego que parece agonizar.
Por conta de tantos equívocos, os cliente começaram a pôr sempre a faca no peito da agência, pois propaganda é cara e os artistas querem prêmios e gelo no uísque. Entendem que somos meros vendedores de centímetros coluna e 30 segundos na TV. Devo admitir que, em alguns casos, eles têm razão. A culpa é do modelo, diria alguns, inclusive eu, mas agora o jogo está mudando, e rápido. Temos mais telas, mais oportunidades, mais chances de business. Agora o cliente é mais informado, ansioso e exigente. Agora o poder está nas mãos dos antigos telespectadores.
Esse ménage à trois gerou um filho incestuoso da miopia com a burrice e a covardia. Campanhas medrosas e ruins. É um saco assistir televisão! Mas é preciso faturar, pagar as contas e mediocrizar. Chegamos à medida do fundo do poço. Os talentos fogem para outros países ou para outras áreas, onde ainda é possível ser um comunicólogo. Agências são ambientes tristes e cinzentos. Estamos com os enjôos da gravidez e logo virá a dor do parto.
Sou diretor de arte. Comecei antes do computador e hoje amo e odeio essa máquina. Ela trouxe praticidade mas também a má formação, ou mesmo, a deformação do meu job description. Se for bom em Photoshop, tá dentro. Também sou diretor de criação e aí começam os problemas. O alento e desespero é saber que isso ocorre mesmo em São Paulo, que é o maior mercado da América Latina: a enorme dificuldade de se encontrar gente capaz de criar um conceito. Parece exagero, mas não é. Assim como o famoso Denorex.
Outro dia, conversando com um dono de agência em Sampa, ele me contava da dificuldade de se encontrar gente que resolva um job de forma inteligente e profissional, e não apenas com uma sacada qualquer. Explico: eu gosto de sacadas, gosto de prêmios e de ideias brilhantes, mas gosto de conceitos e posicionamentos geniais. Itaú Personnalité. Só é perfeito para nós, quando é perfeito para você. Putz,é genial! Ou a campanha Keep Walking. Os anúncios não ganharam prêmios, mas são raciocínio e inteligência em último grau. Conceito forte, toca, posiciona, identifica. E o melhor, dentro do mesmo conceito a Neogama criou o filme “Keep Walking Brazil”, potencial de ouro em Cannes. Desculpe se me empolguei. Gosto de propaganda, demais até. Sou workaholic convicto, sem dramas.
Voltando ao assunto do meu amigo, ele é um calejado atendimento e trabalhou em mais outros três países e dois continentes. Mas tem dificuldade, (isso também por culpa dos próprios donos), pela juniorização das agências, por remunerar gente que só tem o lado palhaço, e não o de dono de circo também. Agora pagam o preço. Das grandes às pequenas, todas vivem esse drama. Ressalto que essa juniorização também está nas empresas e em todos os setores das agências.
A força e a gana da juventude e suas aspirações criativas são uma mola propulsora importante para o nosso mercado, sem dúvida, mas é preciso gente com cancha para formar um profissional que domine sua criatividade e saiba que, atender e criar é o core business do nosso negócio e não apenas secretariar ou trafegar.
Precisamos nos reinventar. Apenas o Brasil trabalha com os 20% de mídia. Isso é nocivo para o negócio e para quem trabalha para o negócio. Um modelo arcaico que é um contraponto exato do posicionamento que conseguimos lá fora, como uma das três potências mundiais em propaganda. Posto esse, cada vez mais ameaçado pelos motivos que citei e por uma porção de outros mais.
Quem conquista a plateia é o palhaço, mas ser dono de circo também é importante.
* David da Silva Sousa, Diretor de Criação da Marcca Comunicação
FONTE: AcontecendoAqui

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