A despeito desta conotação
negativa, a burocracia é importante e sempre será. O que precisamos é usá-la
com bom senso.
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Um amigo empreendedor me confidenciou uma vez que o que estraga na
vida dele é ter que lidar com a parte burocrática da empresa: Folha de
pagamento, demonstrações contábeis, controle dos estoques, reconciliação
bancária, elaboração de contratos, planejamento de fluxo de caixa, envio de
títulos para protesto, revisão do cadastro de clientes, e mais uma infinidade
de coisas que não tem nada a ver com o negócio em si. Ele tem um centro
automotivo e sua grande paixão é atender os clientes, conversar sobre carros,
explicar as vantagens de uma revisão programada, orientar funcionários no uso
de um equipamento computadorizado de diagnóstico, aprender com representantes
de fornecedores algumas dicas para avaliação de suspensão em veículos
importados, navegar pela Internet para se informar sobre o que há de mais
novo em tecnologia de manutenção. Ele nunca imaginou, ao abrir seu negócio,
que precisaria se preocupar com estes ‘detalhes'.
‘Bem, mas são estes ‘detalhes' que definem o sucesso do seu negócio',
aleguei. ‘Porque você não contrata um administrador para cuidar disto?',
sugeri. Sua resposta foi lacônica: ‘Ora, estes profissionais são muito caros.
Outro dia eu vi o salário médio de um gerente administrativo para uma empresa
como a minha. Não compensa! Eu não gosto, mas não tem outro jeito, tenho que
fazer eu mesmo.'
Este episódio me veio à mente justamente quando me vi obrigado a
preencher aqueles diários de classe que todo professor odeia. Ao final de
cada bimestre, temos que preencher quadradinhos, contar faltas, calcular
médias, preencher diários. Aquela obrigação burocrática que o MEC exige e que
me colocou no lugar do meu amigo, me ajudando a sentir o que ele sente. Falar
é fácil, até o momento em que você vivencia o mesmo drama. O meu prazer está
na sala de aula. É explicar o mundo das corporações para os alunos, abrir sua
mente e me extasiar com suas descobertas e seu processo de
transformação.
Em suma, todos nós temos uma parcela de burocracia, ou obrigações que,
à primeira instância, podem parecer mera perda de tempo, mas, se pensarmos
bem, ela é necessária, pelo menos para alguém. O grande problema é que nem
sempre questionamos se alguém atribui algum valor pelo que fazemos. Nos
primórdios da administração profissional, Max Weber e outros teóricos da
administração desenvolveram suas idéias sobre a necessidade das organizações
aprenderem a estabelecer controles, regras, fluxos e métodos para diminuir as
crescentes perdas decorrentes da desorganização e desordem em processos que
aumentavam de complexidade na medida em que as empresas cresciam.
Graças à burocracia, não se perdia mais pedidos de clientes, sabia-se
exatamente quantos itens havia em estoque e quantas peças foram rejeitadas no
controle de qualidade. A burocracia permitiu que as compras fossem mais
inteligentes, pois a decisão se concentrava em apenas uma pessoa. As pessoas
sabiam exatamente quem fazia o quê, os processos passaram a fluir mais
ordenada e rapidamente. A burocracia ajudou a ‘pôr ordem na casa'. Mas
com o tempo, a burocracia acabou ganhando uma interpretação bastante
pejorativa, designando todo e qualquer processo que ‘amarra' a empresa e
impede não só o seu crescimento como a inovação. O problema é que as
vantagens de sua implantação acabaram por alçá-la a um patamar de valorização
extremada que levou ao excesso de uso. De repente, nos encontramos
mergulhados num mar de papel, carimbos, assinaturas, comprovantes, relatórios
e verificações como se mais burocracia trouxesse mais eficiência.
A despeito desta conotação negativa, a burocracia é importante e
sempre será. O que precisamos é usá-la com bom senso. O empreendedor típico
rejeita a burocracia porque olha apenas o seu lado negativo. Como vivemos em
vários sub-níveis da sociedade e não atuamos sozinhos nunca, constantemente
precisamos prestar contas ao governo, aos funcionários, aos chefes e
empregadores, aos clientes e fornecedores, às associações de classe e aos
parceiros e sócios. Que outra forma pode-se aprender com o passado? Como se
pode planejar o futuro sem informações? Como garantir que parceiros cumpram
com que lhes é devido? Como o MEC pode avaliar a qualidade dos cursos
superiores?
As pessoas precisam das regras, pois se sentem mais seguras quando
elas existem. Mesmo para eliminar regras, é preciso estabelecer outras. Uma
vez minha filha pediu para ir à piscina com a amiga. Eu disse que não, pois
ela sabia que a regra era: nenhuma criança pode ir à piscina sem um adulto
junto. Mas, como ela já tinha crescido e ambas já sabiam nadar bem, resolvi
ceder, mas não sem antes colocar outras regras: Não corram em volta da
piscina, não se separem uma da outra, dentro de 1 hora vocês têm que estar de
volta, nada de brincadeiras perigosas.
Liberdade é assim, não se dá de uma vez só, senão as pessoas perdem a
referência. Vai se dando aos poucos, e avaliando como elas vão lidando com a
liberdade que estão conquistando. Quando a pessoa domina o processo, a regra
é inócua e passa a ser vista de forma pejorativa, como algo negativo, que
trava e amarra o processo. Para reinventar a burocracia precisamos trocar as
regras rígidas por regras mais flexíveis na medida em que as pessoas vão
aprendendo mais sobre o processo. Só assim nossas empresas finalmente poderão
se tornar mais competitivas por meio da inovação.
FONTE: CidadeMarketing
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terça-feira, 11 de junho de 2013
Burocracia, um mal necessário
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