Por: Marcos Hashimoto
Luis Carlos é um grande amigo que conheci há 10 anos quando
trabalhamos juntos em um grande banco. Extremamente competente, ele
sempre foi para mim um modelo a ser seguido. Cheio de energia e idéias,
era o profissional que fazia a diferença em qualquer lugar onde
trabalhasse. Implementou vários produtos novos, foi responsável por
grandes projetos estratégicos, sabia se cercar de talentos sempre
motivados, conseguia conciliar sua vida pessoal com a profissional com
maestria invejável, tinha foco e concentrava esforços no que era
importante, tinha visão de futuro e investia hoje para colher amanhã.
Tinha tanta auto confiança que sabia os momentos certos em que podia se
expor e brigar com quem tivesse que brigar. Suas opiniões eram sempre
respeitadas e acatadas. Sua capacidade de perceber o ambiente e
identificar oportunidades era inigualável. Da mesma forma, nunca vi
ninguém com melhor capacidade de comunicação e de influenciar pessoas.
Acompanhei sua carreira desde que nos conhecemos. Após muitas
conquistas, ele se orgulha de ter chegado ao topo de sua carreira:
diretor de tecnologia de uma multinacional francesa. Sua vida era boa,
tranqüila, constituiu uma bela família e vive confortavelmente em um
bairro nobre de São Paulo. Há três meses fui à sua casa para um jantar
com nossas famílias e ele aproveitou para me confidenciar um dilema que
estava vivenciando.
Uma empresa de tecnologia de sistemas americana o havia procurado
havia poucas semanas oferecendo-lhe a seguinte proposta: Abrir a
primeira subsidiária da empresa no Brasil, com total independência para
prospectar mercado, contratar pessoas, estabelecer parcerias, estruturar
serviços, definir estratégias, enfim, montar todo o negócio do zero.
Eles lhe disponibilizariam o software, suporte técnico e treinamento e
todo o material para divulgação. ‘No começo fiquei muito entusiasmado'
disse ele, ‘até que ouvi o lado negativo da história'.
Ele não teria salário, sua remuneração viria dos resultados que
obtivesse. Ele também teria que levantar a maior parte do capital
necessário para instalar o negócio. Acima de tudo, ele assumiria toda a
responsabilidade sobre o empreendimento, fosse um sucesso ou um
fracasso. ‘Não sei se estou pronto para abandonar tudo o que tenho por
uma aventura destas, mas a oportunidade é fantástica, porque eu conheço o
produto dele, é muito bom e acredito realmente que seria um grande
sucesso, pois eu conheço muito bem este mercado', ponderou.
Seu dilema é igual ao de muitos executivos do mercado. Luis sempre
sonhou em abrir seu próprio negócio, mas nunca surgiu a oportunidade. No
início de sua carreira entrou em uma grande empresa só para adquirir o
aprendizado necessário e juntar capital para perseguir seu sonho. Junto
com este aprendizado, veio também o reconhecimento e as oportunidades de
carreira. Junto com as perspectivas de crescimento, os salários
crescentes, os benefícios cada vez melhores, a reputação construída
dentro da empresa e no mercado, a admiração de equipes e colegas, o
bônus altamente atrativo no final do ano, o poder adquirido com a
ascensão na pirâmide hierárquica, uma sala privativa, título de clube
exclusivo, uma secretária e equipe de 20 profissionais de alto nível à
sua disposição, carro da empresa, despesas pagas, plano de previdência
privada, etc. No âmbito familiar, o conforto e o bem estar proporcionado
para esposa e filhas, incluindo aí boas escolas, viagens internacionais
todos os anos, presentes caros, fins de semana tranqüilos no clube,
vida social ativa e de alta qualidade e uma imagem de vencedor invejada e
admirada por parentes e amigos. E o seu sonho do negócio próprio vai
ficando distante, pequeno e insignificante diante do rumo que sua
carreira tomou.
Aí então a oportunidade que ele tanto esperava surge de uma forma
irrecusável. Por mais atrativa que seja uma proposta como esta, a
incerteza e o risco piscam luzes vermelhas de alerta em sua cabeça com
uma relevância que certamente não existiria se ele ainda fosse um
analista de sistemas. Mas se ele fosse ainda um analista de sistemas uma
proposta como esta seguramente não cairia no seu colo. O que você
faria no lugar de Luis? Até que ponto você estaria abrindo mão de seus
sonhos pelo canto da sereia do mundo corporativo? Em que momento nos
deixamos corromper por estas ‘algemas de ouro' que nos prendem às
conquistas obtidas e nos impedem de dar novos saltos em sua vida
profissional?
Estaria ele disposto a resgatar seu sonho, não deixar passar esta
oportunidade, e enfrentar as dificuldades inerentes ao empreendedor?
Estaria ele pronto para se defender de todos que o criticarão,
principalmente sua própria família que mais sofrerá com esta decisão?
Outra coisa, ele sabe que tem uma excelente formação como executivo, mas
ele não tem certeza se esta formação é suficiente para ser um
empreendedor. Ele tem plena consciência que outras habilidades serão
necessárias para conduzir um novo negócio, mas ele nunca investiu no
desenvolvimento destas competências. Como especialista em
empreendedorismo eu não podia deixar de mostrar as vantagens de
enfrentar o risco, principalmente para o desenvolvimento pessoal, mas
também fui obrigado a reconhecer a força das algemas de ouro. No
entanto, de tudo o que falei, uma coisa lhe chamou a atenção quando lhe
perguntei: ‘Se você partir para esta aventura e não der certo, até que
ponto este "fracasso" mancharia seu currículo?'
Sua primeira e instintiva resposta foi acreditar que jamais haveria
espaço no mundo corporativo para ele, pois existiria preconceito contra
ex-executivos que se tornam empreendedores fracassados e tentam voltar
para as grandes empresas. Eu disse a ele que boas empresas já quebraram
este paradigma, principalmente depois que elas descobriram, no início da
década, o valor dos executivos que abandonaram seus empregos para
entrar no mundo da internet e foram apanhados pelo estouro da ‘bolha' da
especulação. Alguns destes executivos voltaram para seus empregos
originais com uma bagagem e experiência para novos negócios que
dificilmente adquiririam em seus empregos. Muitas empresas estão
percebendo o valor do aprendizado adquirido ‘lá fora'.
Luis me escutou. Tomou a decisão de se arriscar diante da
possibilidade de aprendizado e enriquecimento pessoal. Fiquei contente
por ele. Algum tempo depois, voltei a encontrá-lo e quando perguntei
como ia o novo empreendimento fiquei surpreso com sua resposta. Ele
mudou de idéia e continuou no seu emprego. ‘Por quê?' perguntei
surpreso. Sua resposta foi lacônica, em um tom de voz que me antecipou
tudo: ‘Perguntei à minha família o que eles achavam e você já sabe como
foi a reação!'.
FONTE: Cidade Marketing
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