quinta-feira, 11 de julho de 2013

O Copo Inquebrável

Por: Elóy Simões

1.    “Minha mãe comprou um copo inquebrável. Mas de vidro mesmo, vidro de verdade, e isso me deixava fascinado porque, quando tal fato teve lugar, o autor destas linhas tinha apenas poucos anos e suas faculdades mentais ainda não estavam suficientemente desenvolvidas para que pudesse imaginar que um copo em tudo semelhante aos que caem e fazendo trinn! (proporcionando uma boa dose de pescoções), pudesse ser inquebrável.Inquebrável! Parecia uma palavra mágica. Experimentei uma, duas, três vezes e o copo caia, quicava com um estrondo dos diabos e parava intacto.Certa tarde vieram uns conhecidos e oferecemos um chocolatinho (note-se que então tais guloseimas existiam, e em profusão). Com a boca cheia (não lembro se de Guianduia ou Strelio ou Caffarel-Prochet), vou até a cozinha e volto com o famoso copo na mão.(Umberto Eco em A Misteriosa Chama da Raínha Loana)“Senhoras e senhores”, exclamo com voz de proprietário de circo chamando os passantes para o espetáculo “apresento-lhes um copo mágico, especial, inquebrantável. Vou jogá-lo no chão e verão que não quebra”, e acrescento com ar grave e solene, “PERMANECERÁ INTACTO”.Jogo e..nem preciso dizer, o copo voa em mil pedaços.Sinto o rubor subir, olho alucinado para os cacos que, tocados pela luz do lampadário, brilham  como pérolas… e rompo em prantos.”

2.    Quantas vezes coisas desagradáveis acontecem no relacionamento entre agência e cliente, contribuindo para um afastamento mútuo? Do lado da agência vai cimentando a ideia de que “esse cliente é muito chato”, “não dá pra trabalhar com ele”, “não passa o brief direito” “é muito malcriado”, “não respeita o trabalho da gente”, e vai por aí afora.Do lado do cliente, as coisas também vão piorando. “Essa agência não entende o brief”, “a criação é muito fraca”, “eu tenho de refazer o trabalho dela”, “gosta de fazer gracinha, ao invés de anúncios que vendam” e as coisas vão gelando.Na verdade, no fundo são pequenas coisas que poderiam ser superadas se percebidas a tempo. No entanto, elas vão ocorrendo como o copo que a gente pensa que não quebra. A gente tende a achar que é possível superar cada incidente.Vivi um problema assim em uma das agências em que trabalhei. Tinha acabado de ser contratado e fui a uma reunião das segundas-feiras – aquelas em que se confere o que há para fazer -  e fiquei horrorizado. Ali, os clientes eram ridicularizados, tratados como palhaços, ignorantes. Felizmente cheguei a tempo de corrigir isso. A agência deslanchou.

3.    O fato é que na vida real nada é inquebrável, sobretudo quando se trata de relacionamento de negócios. Então, um dia a corrente se rompe.O copo quebra.O responsável pela agência chega e recebe a notícia: a conta já não é mais dela. Para surpresa dele, a conta, em outra agência, está anunciando. Bastante.“Mas como ele nunca faturou assim que conosco?,” pensa.Tivesse prestado a atenção nos detalhes e teria previsto isso. Ou poderia ter evitado que ocorresse.

4.    Teria visto que pequenas coisas acabaram empurrando agência e cliente para uma crise.É a história do copo, contada pelo Umberto Eco. Um errozinho aqui, um incidentezinho ali, uma palavra mal compreendida acolá, um anúncio que atrasa, e ele vai caindo sem quebrar, até que um dia…

5.    Como evitar isso?  São tantas as coisas que precisam ser cuidadas que não há como prestar atenção em tudo. No entanto, é preciso abrir bem os olhos e os ouvidos. Nem que seja necessário contar com ajuda de alguém de fora.Mas isso depende do tamanho do risco que cada um está disposto a correr.

FONTE: AcontecendoAqui

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